Do mesmo time

21 de jul. de 2010 - não enviada por Camila Rufine 5 comentários
De todas as crianças do parque, identifiquei-me com o menino de cabelo branco e camiseta roxa.

Eu esperava a hora passar, enquanto observava a profusão de crianças a brincar. Atentei-me ao tal menino, que, minutos atrás, fazia o inferno da vida de uma garota que supus ser sua irmã mais velha. Ele a provocou, empurrou e tirou sarro até que ela resolveu retrucar: deu-lhe uns bons sopapos, arrancou-lhe algumas lágrimas, foi para longe, deixando-o cabisbaixo, a quicar a sua bola de borracha e provavelmente pensando em como o mundo era injusto.

Mais rápido do que qualquer psicólogo infantil preveria, o mesmo menino quase albino da camiseta roxa já tinha parado de se lamentar e estava brincando de bola com outra menina. Não sei se sua irmã, acredito que não. A brincadeira fluiu pacificamente até que a garotinha arremessou, sem querer, a bola para muito longe. E ele, é claro, jamais perdoaria um deslize tão grave. Deu um jeito de espantá-la com a sutileza de um tornado e ficou ali, sozinho, obtendo sucesso zero ao tentar quicar sua bola no gramado macio.

Após muita insistência, o menino roxo, ops, digo, o menino da camiseta roxa resolveu dar uma segunda chance à menina que jogou a bola muito longe. Mas ele fez suas exigências. Ela não poderia mais segurar a bola. A ela só caberia observar. Tarefa tão maçante que não tardou para que ela desse um basta, pegasse o seu patinete e fosse para o outro extremo do parquinho, com a cara amarrada. O menino reagiu com desdém e foi brincar nos escorregadores, fingindo entusiasmo. Depois que escorregou do brinquedo mais alto, ele sacudiu a poeira e me encarou, daquele jeito que só as pessoas que se entendem muito se olham.

O menininho de cabelo branco e camiseta roxa é o dono da bola, mas não tem com quem brincar.

Lápis de cor

18 de jul. de 2010 - não enviada por Graci 3 comentários
Amo você.

Daquele jeito que não tem explicação, como o sorriso inteiro que surge no rosto com o “te amo você também”.

Amo quando você rouba brócolis do meu prato, finge que meu corpo é uma pista de corrida, quando diz que eu sou linda e a mais que mais preferida.

Amo colocar minha mão nos seus cabelos, meu nariz no seu pescoço para aspirar seu cheiro até o perder o ar, olhar seu rosto tão de perto e decorar cada pintinha de beleza.

Amo o olhar o matreiro, encantado, encantador... A bagunça da madrugada, a pressa do café matinal sem pressa.

Amo as descobertas e as lições que você me passa. Amo a pessoa que você é e a que me fez ser.

E não tem amor maior mundo, nem saudade que mais doa que a sinto por você.
Aposto que a luz de seus cabelos é suficiente para colorir inteiro esse céu cinza que ficou sobre mim a semana inteira, então, vem logo.

Amo você, não esquece.

Leite, torrada e mel

9 de jul. de 2010 - não enviada por Camila Rufine 7 comentários

Aconteceu há 10 anos.

No carro, íamos minha mãe e eu. Ela estava muda, mas na metade do caminho resolveu arriscar:

- Filha, quem é Onêi?
- O Nei? O Nei é o pai, ué.
- Não, Camila. Onêi. H - O - N - E - Y.
- Honey?! Honey é mel em inglês.

Minha mãe desviou o olhar da estrada e me fitou, procurando por algum indício de mentira. Quando viu que eu realmente não sabia do que ela estava falando, começou a rir...

- Qual é a graça, mãe?
- É que seu pai viu isso escrito no espelho quando saiu do banho e me chamou, achando que era o nome de algum paquerinha seu. Ele ficou uma arara. Até me pediu para investigar tudo e contar para ele.
- Hahahahahahahaha...

Eu não conseguia parar de rir, mas me dediquei a lembrar o que poderia ser aquilo.

- Ah, mãe! Eu já sei. Tem essa banda que eu gosto, Roxette. Esses dias eu estava ouvindo a música durante o banho e escrevi "honey", pois tem isso na letra. E deve ter ficado lá quando o espelho embaçou novamente.
- Hummmm, entendi.
- Hahaha. Mas não conta para o pai que você sabe, que eu quero judiar dele mais um pouco.

Minha mãe, famosa por adorar pregar peças, não se opôs. Naquela mesma noite, após ter acabado de tomar meu banho, olhei para o espelho embaçado e não me contive. Desenhei um grande coração transpassado por uma flecha e escrevi "H e C" dentro.

Para a minha aflição, meu pai demorou ir tomar banho e após um tempo eu já tinha esquecido da brincadeira. Só fui lembrar quando, mais tarde, senti a casa estremecer com um grito furioso vindo do banheiro:

- MUIÉ, VEM CÁ. AGORA!

E minha mãe foi, já imaginando qual era o problema ao me ver gargalhando baixinho na sala de TV. Do lado de fora, não pude ouvir nada do que eles conversaram. Mas acho que ela lhe contou a verdade. Logo que a vi sair do banheiro, ela me deu um soslaio e um sorriso discreto. Minutos depois meu pai apareceu na sala, com o cabelo molhado, todo sisudo e de poucas palavras:

- Não quero conversa. Vai começar o jornal.


Felicidade

4 de jul. de 2010 - não enviada por Camila Rufine 3 comentários
Ter muito dinheiro. Atingir o sucesso profissional. Possuir um guarda-roupa abarrotado. Colecionar bolsas e acessórios. Ter duzentos pares de sapato. Implantar umas centenas de mililitros de silicone em cada seio. Arrebitar o nariz. Diminuir dois números do manequim. Comprar um carro conversível. Alcançar o milagre de cabelos lisos, sem precisar de chapinha. Conseguir poros menores, pés mais delicados e mãos macias. Ter a companhia de amigos super inteligentes e dotados de bom gosto musical/cinematográfico. Viajar, sempre, para todo lugar. Ser fluente em mais alguns idiomas. A oportunidade semanal de um porre decente e sem ressaca. Esquecer de esperar todos os dias pelo amor.